O prefeito de Istambul, Kadir Topbas, expressou sua preocupação com os
protestos que durante dois dias paralisaram sua cidade e teme que os incidentes
possam afetar a candidatura para os Jogos Olímpicos de 2020. Em entrevista
concedida ontem à noite à emissora NTV, o prefeito qualificou a retirada
policial como "tardia demais" e se perguntou como explicar ao mundo o
que aconteceu nos últimos dias em sua cidade.
Os protestos também praticamente repercutiram nas relações
internacionais e econômicas da Turquia como a queda da bolsa de Istambul em
10,47% no dia seguinte após o inicio dos protestos.Os protestos também
começaram a afetar o setor turístico na Turquia, onde 40% das reservas
hoteleiras foram canceladas nos últimos dias na cidade de Istambul.
"Nos dois últimos dias, os hotéis em Taksim (ao redor da praça que
aparece como epicentro das manifestações) e em Kadikoy (região de Istambul)
começaram a ficar vazios. Os cancelamentos das reservas são de até 40%",
advertiu nesta terça-feira a um jornal local Milliyet Timur Bayindir,
presidente da União de Hotéis e Investidores Turísticos.
O presidente desta organização assegura que vários países estão
recomendando seus cidadãos a não viajar mais ao país durante esse
conflito.
Segundo Bayindïr, junho, que normalmente é muito rentável para o setor,
poderá ser um mês de significativas perdas. Diante deste fato, a Federação de
Proprietários de Hotéis assegura que os cancelamentos já chegam a 10% no país
devido às imagens das manifestações transmitidas ao redor do mundo.
A Bolsa de Istambul está protagonizando o registro das perdas mais
fortes desde 2001, com uma queda de 8%, enquanto a lira turca se desvalorizou
tanto frente ao dólar como diante do euro.A situação também praticamente
congela a candidatura do país para ingressar como membro da União Europeia.
"Como explicaremos as imagens que se refletiram, sem mais
comentários, no mundo todo para mostrar os incidentes ocorridos em Istambul?
Como vamos continuar a convidar os Jogos 2020 para Istambul? Acho que aqui todos
perdemos alguma coisa", refletiu Topbas.
Istambul era considerada a grande favorita para os Jogos Olímpicos de
Verão de 2020,e está junto com Madri e Tóquio na final do processo de seleção
para organizar os Jogos e a decisão final será tomada dia 7 de setembro na 125
ª Sessão do Comitê Olímpico Internacional (COI) em Buenos Aires.
O slogan da candidatura "Bridge Together" (Uma ponte, juntos)
insiste no papel de Istambul como cidade capaz de unir diferentes culturas e
visões através do diálogo e da convivência, imagem essa afetada pela violenta
intervenção policial dos últimos dias.
Entendendo a situação
A Turquia, país cuja população é majoritariamente muçulmana, é
dirigida há mais de 10 anos por um partido do movimento islâmico, que segundo
círculos laicos, tenta islamizar a sociedade turca.O Partido da Justiça e
Desenvolvimento,recentemente aprovou leis polêmicas no Parlamento como a
proibição da venda de bebidas alcoólicas durante a madrugada no país e uma lei
que proíbe casais se beijarem nas ruas.O AKP considera-se um partido moderado e
conservador, defensor de uma economia de livre mercado e do acesso da Turquia à
União Europeia.Além da grande reforma urbana que o primeiro ministro Recep Tayyip Erdoğan,tem
colocado a prática e estas leis estão na origem da contestação que sacode o
país a alguns dias, com manifestantes que se mobilizam contra os ideais
conservadores que tomam conta do país.
Foi em um pequeno espaço verde, com cerca de 600 árvores no coração do
lado europeu de Istambul.
As primeiras manifestações aconteceram no parque Gezi para impedir a
construção no local da réplica de uma caserna militar do império otomano, que
deve abrigar um centro cultural, um centro comercial e, como Erdoğan ressaltou
no domingo, uma mesquita.
"Podemos ver claramente a síntese entre o liberalismo e o islamismo
do governo: de um lado ele fala em construir um grande centro comercial e, de
outro, fala em construir uma esplêndida mesquita que simbolizará a glória da
sociedade muçulmana", considera Simten Cosar, cientista político da
Universidade de Hacettepe (Ancara).
O símbolo ganha mais força pelo fato de o parque Gezi estar
localizado nos arredores da Praça Taksim,aquele local que por décadas foi o
local de manifestação de todas as lutas sociais. "Trata-se de transformar
Taksim em um local mais conservador, mais capitalista. Trata-se de um acerto de
contas com a corrente reformista", confirma o urbanista Murat Cemal
Yalçintan, da Universidade Sinan.
O governo também lançou um projeto de construção de uma mega mesquita
com uma capacidade de 30 mil lugares na colina de Camlica,o ponto mais alto da
cidade, com vista panorâmica do Bósforo. E para além do parque Gezi e da
construção de mesquitas, Erdoğan, e seu Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP) têm outras
ambições para Istambul,alegando que elas fazem parte do Plano Turquia 2023,um
grupo de metas para a política do país,entre elas estar no grupo das 10 maiores
economias do mundo,entrar para a União Europeia e transformar o país no quinto
país mais visitado do mundo .Para isso,o governo turco também quer realizar
grandes eventos no país.Nos anos recentes,tivemos a Copa do Mundo FIBA de
Basquete de 2010,a Universíada de Inverno de 2011 em Erzurum.Estão também
marcados os Jogos do Mediterrâneo deste ano em Mersin e o Campeonato Mundial de
Basquete Feminino no ano que vem.Também estava no planejamento a UEFA Euro
2020,cujo o país foi candidato único.Mas,a recessão de 2008,forçou a UEFA a
conduzir uma mudança no formato da edição de 2020,que não terá sede fixa.
Ao norte da cidade, o primeiro-ministro lançou oficialmente na semana
passada a construção de uma terceira ponte ligando as duas margens do Bósforo,
por um valor de cerca de US$ 3 bilhões. A função da ponte é de simbolizar as
ambições econômicas e políticas do país,desafogando o tráfego no Bosfóro,cujas
obras irão durar dois anos. A ponte que sugestivamente poderá ser chamar
sugestivamente de Ponte Olímpica de Istambul deve integrar um gigantesco
projeto, que inclui a construção do segundo aeroporto internacional - que
poderá receber até 150 milhões de passageiros por ano a de espetacular canal
ligando o Mar Negro ao Mar de Marmara para aliviar o Bósforo e de duas novas
cidades, cada uma com um milhão de habitantes, às margens deste canal.
"O objetivo deste projeto é a abertura de novas terras para a
construção", alerta Tayfun Kahraman, presidente da Câmara dos Urbanistas
de Istambul, que instalou uma tenda no parque Gezi.
"Na cidade, não há mais terras aptas à construção. É por isso
que o Estado privatiza todos os terrenos públicos e aprova projetos gigantes de
infraestrutura que devem permitir declarar novos terrenos construtíveis",
acrescenta Kahraman, lamentando a provável destruição das florestas do norte de
Istambul, "uma riqueza natural de importância vital para a cidade".
Por trás desses grandes projetos, como os mais discretos de reabilitação
urbana, muitos denunciam o domínio de determinados grupos econômicos ligados ao
AKP sobre a cidade.
"Está claro que o projeto de reabilitação urbana não foi concebido
para proporcionar melhores condições de moradia para as pessoas, mas para mudar
de mãos alguns títulos de propriedade", comenta Sami Yilmaztürk,
secretário-geral da Ordem dos Arquitetos de Istambul.
Ele lembra que, em muitos bairros "remodelados", os moradores
mais pobres foram forçados a procurar uma nova casa nos arredores da cidade,
dando lugar a uma população mais abastada, para a alegria das imobiliárias.
"Há muitos exemplos em Istambul, onde terrenos municipais foram
vendidos e, em seguida, tiveram seu plano de ocupação da terra modificados para
permitir a construção de grandes arranha-céus. Há enormes interesses
financeiros, que envolvem grupos bem definidos", indica, por sua vez,
Kahraman. "As pessoas estão conscientes e reagem muito fortemente a
isso", diz o urbanista, considerando que "os moradores de Istambul
querem tomar posse de sua cidade."
Das Agências Internacionais,com adaptações feitas pelo próprio autor.
Nenhum comentário:
Postar um comentário